Há um homem e seu revólver, e seu revólver mira um
ladrão. E com os olhinhos indo do homem ao revólver, do revólver ao
ladrão e de volta, está o filho do homem.
Um cataclismo inexplicado e inexplicável subjugou o mundo, privou-o
praticamente de quase toda a vida, seja ela animal ou vegetal, e
condenou a raça humana aos espasmos irados e perdidos que antecedem a
o perecimento total. Cidades são os destroços que restaram do
caos, florestas são o que sobrou das queimadas, os céus clamam seu
ódio com trovões, chuvas e neve enternos, intercalados, e até o ar
parece estar encontrando seu fim, dissolvendo-se em cinzas eternas, em
todo lugar. O Mundo é o que o Fogo deixou por terminar. Nem Sol se vê nem a Lua
ninguém nunca mais viu.
Os profetas triunfaram, os Quatro Cavaleiros já se dispersaram na
criação, o mundo já acabou.
Mas há aqueles poucos, aqueles poucos que haveriam de sobrar. Eles
erram na Terra, atrás de comida e de calor e de um novo dia. A comida
é o que sobrou das latas em conserva, das coisas que puderam não
entrar em combustão. Claro, o terreno perfeito para o que há de mais
natural no ser humano extravasar: reina a violência, o canibalismo, as
gangues, os saques, a impiedade. Estupro, roubo, assassinato. É
difícil crescer assim. É difícil ver um filho crescer assim.
Um pai e seu filho começam um movimento em direção à costa do
país, ao Sul, na esperança de sobreviver ao inverno. E eles vão
atravessar tudo isso, portando apenas um revólver com duas balas, uma
muda de roupa, uns cobertores e tudo o que puderem levar num carrinho
de compras. "Um o mundo do outro".
Esse é o panorama de A Estrada, de Comarc McCarthy(não se preocupe, nem eu consigo lembrar o nome do cara de cabeça!), um livro de
relevância literária contemporânea sobre amadurecimento,
sobrevivência e tudo o mais que se puder aplicar. Ganhador do Pulitzer
e considerado um dos melhores livros da década.
E, claro, na minha opinião uma verdadeira aquisição tanto
substancial quanto estilística. Aqui os diálogos não são separados
por apóstrofos ou travessões; eles são espalhados no meio da
narração, como se fizessem parte da narrativa sólida, ou de uma memória apenas.Ou ainda,como se o autor estivesse falando com o leitor.
Vou lhes contar um segredo. O homem do início não tinha praticamente
nada no seu carrinho que fora roubado;mas ainda assim, era tudo o que
possuía. O ladrão tinha menos ainda, tinha a roupa do corpo. O
menino.... O menino tinha um coração e outras coisinhas que não se
podem ser roubadas. Ainda assim, o homem aponta a arma para o ladrão,
manda-o tirar as roupas, no que é obedecido. Ainda raivoso, exige que
do ladrão também fiquem os sapatos. E parte em seguida, deixando o
ladrão com uma mão na frente e outra atrás.
O menino, calado. "Ele mereceu", o pai fala em tom bravo. "Ele tinha
fome, papai. Ele tinha medo, papai", responde-lhe o menino, entre
lágrimas. "Nem o matei, oras!", tenta o pai.
"Sim, papai. O senhor o matou"
"O que? Não é você quem tem de se preocupar com tudo, sabia?Eu
também tenho medo, tenho fome!", o pai responde, desvairado. O menino
balbucia algo. " O que?!", pergunta o pai. " Sim papai, sou eu quem
tenho de me preocupar!", responde o menino, em toda a sua sapiência de
o que? 10 anos de idade?
O livro vence quando,como qualquer grande obra, deixa de ser algo fixo e imutável e passa a ter tantas interpretações quanto é possível à mente lhe aplicar. E venhamos e convenhamos, assistir enquanto um homem atravessa um EUA sitiado, sem nada para chamar de próxima refeição e com apenas duas balas no revólver E um filho de 10 anos; cara, se isso não é extremamente maneiro, eu não sei o que é maneiro!
Nem quis fazer a parte 2 da resenha
ResponderExcluirNão gostei mais ú.u/
Mas que caos que eh essa coisa...
ResponderExcluirSe eu não lesse direito acharia que se tratava de um conto de zombies...
Depois de uma avalanche de livros de romances juvenis e de criaturas das "trevas" estava na hora de termos um livro mostrando o verdadeiro horror da humanidade e bem escrito. Preciso achar onde comprar /hm.
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