Essa loja de brinquedos é diferente.
Os bonecos que ela vende, ela é que manufatura.
Não sei que produção é essa, não sei que meticulosas mãos são essas que
delineiam e detalham os produtos de forma tão insanamente
perfeccionista. Os resultados finais são obras-primas tão íntegras, tão símiles,
que o toque às mãos deixa emocionado qualquer que o ouse. Encostar nos bonecos
é como encostar em pele real, talvez sinta-se até o calor por baixo dela. Seus
olhos parecem emitir aquela luz dos olhos das coisas que vivem. Os cabelos
estão lá, só falta crescerem, seus fios tão belos e naturais que muitos humanos
se curvariam em inveja. Até seus lábios possuem uma maciez tentadora; tudo isso
em bonecos de 10 cm de altura. A única coisa que denuncia sua artificialidade é
um pequeno botão localizado naquela parte das costas que humano adulto algum
consegue encostar com seus dedos. O que fazia o botão foi uma curiosidade que
me consumiu desde o primeiro minuto em que os vi na vitrine.
Fascinado, comprei dois: um casalzinho. Levei-os
para casa na sacola contagiado por uma emoção de difícil explicação. Ao chegar,
coloquei-os numa cômoda larga; fiquei abismado ao notar o quão fácil era
deixa-los de pé. Seus pezinhos formavam base perfeita que, combinada com o peso
e a inclinação da coluna, sustentavam os bonecos quase como se assim eles
desejassem. Observei-os por minutos a fio, tentando absorver cada detalhe, cada
minúcia de seus corpinhos. O rapaz imitava perfeitamente um jovem entre seus 25
e 30 anos, com traços de barba, trajando blusa e jeans. A garota, não com menos
perfeição, era uma mocinha de idade semelhante que portava um vestido azul.
Decidi então descobrir finalmente o que fazia o botão; peguei o rapaz e
pressionei o botão em suas costas. Fiquei então olhando sua face, esperando
qualquer sinal de movimentação. Ele apenas continuou me olhando da mesma forma
estática. Frustrado, coloquei-o de volta na cômoda, derrubando a mocinha de
costas no processo.
Voltei-me e fui procurar a caixa da loja na
sacola. Achando-a, tentei localizar seu número de telefone, pronto para soltar
alguns palavrões ao dono, acusando-o de vender bonecos problemáticos.
Lembrava-me bem que o senhor me prometera que os bonecos faziam algo
simplesmente inacreditável quando pressionados seus botões. Mera baboseira,
falsa propaganda para atrair os consumidores incautos como eu. Achando o
número, peguei o telefone e disquei-o. No ato, virei-me novamente para encarar
o produto defeituoso. A surpresa que tive fez com que eu derrubasse não apenas a
caixa que eu segurava em uma mão como o telefone que eu segurava na outra; e a
boca, fazendo sumir qualquer intenção de me utilizar de palavras feias.
Na mesa, o rapazinho de 10 cm de joelhos estava,
ao lado da mocinha, e lhe sacudia os ombros. Falava-lhe baixinho, segurava suas
mãos, tentava chamar-lhe atenção de toda forma. Suas pernas e seus membros em
geral não possuíam articulações visíveis, mas até os dedinhos agora se
dobravam, se abriam e se fechavam como se por baixo da camada suave de pele
houvesse as mais complexas e minúsculas peças de engenharia. Sua boca se mexia
deixando visualizar esporadicamente fileiras de dentes branquinhos. Logo
percebi que o bonequinho não me notava ou era incapaz de me dar atenção, mesmo que por vezes olhasse ao redor, como que
procurando alguém que pudesse ajudar a outra bonequinha.
Movido por uma sensação estranha de urgência, peguei a bonequinha de onde ela se encontrava. Notei que o boneco, por sua vez, ao que retirado o objeto de sua atenção da frente de seus olhos, simplesmente permaneceu imóvel. Rapidamente pressionei o botão da bonequinha. Olhei-a ainda em minhas mãos, sem saber o que esperar. Nenhum movimento. Depositei-a então onde antes estava, da mesma forma que havia lhe tirado. Vi então ela piscar os olhos e começar a se mover. Na mesma hora, o boneco que antes estava imóvel voltou a mover-se. Seus olhinhos diminutos se encontraram. A coisa mais estarrecedora aconteceu a seguir:
Movido por uma sensação estranha de urgência, peguei a bonequinha de onde ela se encontrava. Notei que o boneco, por sua vez, ao que retirado o objeto de sua atenção da frente de seus olhos, simplesmente permaneceu imóvel. Rapidamente pressionei o botão da bonequinha. Olhei-a ainda em minhas mãos, sem saber o que esperar. Nenhum movimento. Depositei-a então onde antes estava, da mesma forma que havia lhe tirado. Vi então ela piscar os olhos e começar a se mover. Na mesma hora, o boneco que antes estava imóvel voltou a mover-se. Seus olhinhos diminutos se encontraram. A coisa mais estarrecedora aconteceu a seguir:
Os dois bonequinhos se abraçaram.
Levei as mãos à testa, sem conseguir acreditar no
que meus olhos me ofereciam.
(Não lembro por que não dei prosseguimento!)