Outro
dia eu estava lendo sobre a legalização da maconha em algum lugar
da internet quando me deparei com um diálogo que me despertou a
atenção. Um dos comentaristas escreveu que detestava um dos outros
usuários porque o achava um viciado irresponsável que não queria
saber de nada, que passava seus dias, despenteado, fumando, fedendo e
destruindo a sua juventude. Então alguém lhe respondeu que não
cabia a ele falar nada, pois tratava-se de uma escolha pessoal do
indivíduo. Ah é?
Hoje
em dia a cultura mundial se expandiu com tal velocidade e com tanta
potência que a diversidade usualmente é acachapante. Com mais
frequência do que seria esperado nós nos deparamos com hábitos,
com maneiras, com costumes de origem desconhecida. Essas diferenças
podem ocorrer pelo simples transplante cultural, onde temos, por
exemplo, aquele amigo que todo mundo tem que é viciado em cultura
japonesa e parece um esquisitão total aos olhos dos nacionais mais
tradicionais; podem ocorrer também pela fusão que as pessoas são
propensas a fazer de costumes diversificados, o que explica desde
aquelas pessoas que tem apenas um senso de moda “bizarro”, até
aqueles que se diversificam de forma tão obstinada, uniforme, que
viram subculturas que logo são rotuladas e amadas/discriminadas à
arbitrariedade do senso comum.
Esses
comportamentos, por si só, não são passíveis de repreensão.
Oras, no amálgama moderno apátrida que é a internet, nos milhares
de pessoas que convivem diuturnamente e que encontram seu jeitinho
próprio de expandir sua personalidade e na subsequente facilidade
com que se percebe os padrões e as similaridades que comprovam a
limitação flagrante na originalidade humana, fica mais e mais
necessário que as pessoas busquem atitudes cada vez mais extremas
para provarem (tanto para si quanto para seus iguais) a sua
identidade. Nesse âmbito, eu creio, surgem as escolhas pessoais.
Algumas mais efêmeras, que refletem na maneira de se vestir, de se
portar, outras mais fortes, que se traduzem na maneira de agir, de
pensar, e até mesmo aquelas mais extremas que resultam em
verdadeiras transformações de concepção de vida. Isso tudo,
claro, é fruto da busca do homem pelo seu cerne individual, a sua
necessidade de se estabelecer como um sujeito autoconsciente e
aceito.
Mas
eu acho que todo essa conceituação deve ser obrigatoriamente
confrontado com a noção humana básica de, bem, autopreservação.
Não creio que seja legítimo qualquer comportamento que implique a
auto lesividade, sabe? Não importa de qual religião você seja,
mesmo que você não tenha religião na verdade, as chances são de
que a auto flagelação imotivada, ou erroneamente motivada, não
faça parte do seu conceito de normalidade. A autopreservação,
entenda, não é aquele simples instinto que te diz para não se
machucar, mas sim aquele que diz para você não se machucar por
nada. Na maturação humana a auto flagelação, na verdade, é
constante. São as noites sem dormir e os dias desconfortáveis para
estudar, para se divertir, sei lá, nós nos forçamos a muitas
coisas quando temos objetivos. Mas sabe, a autopreservação deveria
agir quando nos colocamos em uma perseguição fútil ou tentamos nos
prejudicar por nada. A autopreservação é isso, é o ser humano se
afastando da sua danação através da aplicação de sua própria
sensatez, esperteza, etc.
Então,
a auto-exploração versus a autopreservação. Onde está você?
Você é desses que acha que o manto das “escolhas pessoais” te
deixa imune ao criticismo fundamentado, só pelo bel fato ser uma
escolha que você fez? Ou você é capaz de procurar o melhor para
si? Há uma diferença entre a Lady Gaga ou o Eminem, que procuram
chocar com o objetivo de impor sua originalidade enquanto fazem rios
de dinheiro, mesmo à custa de sua liberdade pessoal, credibilidade
ou respeitabilidade, e alguém que te machuque ou que te roube. Todos
esses indivíduos fizeram, oras, escolhas pessoais. Apenas um deles
não atendeu ao conceito de autopreservação (penal, social,
jurídica, política, moral, etc) que eu mencionei, você consegue
dizer qual?
E
o sujeito que desperdiça a vida (a dele e a de seus próximos)
fumando maconha, ou ingerindo qualquer tipo de substância
imprestável, ilícita ou não, de fácil obtenção ou não? Você
acha que ele não é passível de crítica só porque “ele fez uma
escolha pessoal”?
E
sabe, se você tem um conhecido que está viciado em algum tipo de
droga e você quer sinceramente ajudá-lo, não creio que não
criticá-lo seja o melhor caminho. Aposto, aliás, que você vai sim
utilizar o desprezo e a crítica gerados pela autopreservação; só
que vai canalizá-lo na direção das drogas e não da pessoa por
quem você preza.
Sim,
estou dizendo que o homem não pode se desvincular do sentimento de
desprezo, ódio, raiva, etc, jamais. Por mais que os contos de fada e
os livros de autoajuda te digam o contrário.
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